sábado, 21 de maio de 2016

O Evangelho Secreto de Marcos (Parte 02)

A Dinastia de Jesus

Se Jesus foi realmente casado com Madalena, poderia tal casamento ter servido a algum propósito? Em outras palavras, poderia ele ter significado algo mais que um casamento convencional? Poderia ter sido uma aliança dinástica de algum tipo, com repercussões e implicações políticas? Em suma, poderia uma estirpe resultante desse casamento ter garantido o nome "sangue real"?
O Evangelho de Mateus afirma explicitamente que Jesus era de sangue real, era um rei genuíno, o descendente de Salomão e Davi.
Se isto for verdade, ele teria gozado de uma pretensão - talvez a pretensão legítima - ao trono da Palestina unida. E a inscrição afixada na cruz teria significado mais que uma mera brincadeira pejorativa e sádica, pois Jesus teria sido realmente "rei dos judeus". Sua posição, em muitos aspectos, seria análoga àquela, por exemplo, do príncipe Bonnie Charlie em 1745. Ele teria enfrentado a oposição que enfrentou precisamente em virtude de seu papel, o papel de um rei-sacerdote que poderia unificar seu país e o povo judeu, representando assim uma séria ameaça tanto a Herodes quanto a Roma.
Certos estudiosos bíblicos modernos têm argumentado que o famoso "massacre dos inocentes" nunca ocorreu realmente. Mesmo que tenha ocorrido, ele provavelmente não atingiu as proporções terríveis que lhe foram atribuídas pelos Evangelhos e a tradição posterior. Mas a própria perpetuação da história parece atestar alguma coisa – algum alarme genuíno por parte de Herodes, alguma ansiedade real, relacionada com a possibilidade de ser deposto. Ora, Herodes era um governante extremamente inseguro, odiado por seus súditos escravizados e mantido no poder pelas cortes romanas. Mas por mais precária que fosse sua posição, ela não pode ter sido realmente ameaçada por rumores de um salvador místico ou espiritual - do tipo que, de qualquer modo, abundava na Terra Santa da época. Se
Herodes estivesse mesmo preocupado, seria por uma ameaça muito real, concreta, política, a ameaça trazida por um homem que possuía uma pretensão mais legítima ao trono que a sua, e que poderia conseguir um substancial suporte popular. O "massacre dos inocentes" pode nunca ter ocorrido, mas as tradições relacionadas com ele refletem alguma preocupação, por parte de Herodes, com uma pretensão rival, indicando também, possivelmente, alguma ação para embargá-la. Tal pretensão só podia ser de natureza política. E deve ter merecido ser levada a sério.
Sugerir que Jesus tivesse tal pretensão é, certamente, desafiar a imagem popular do "pobre carpinteiro de Nazaré". Mas existem razões persuasivas para fazê-lo. Em primeiro lugar, não é certo que Jesus era de Nazaré. "Jesus de Nazaré" é na realidade uma distorção, ou má tradução de “Jesus o nazorita”, ou “Jesus o nazoreano”, ou talvez “Jesus de Genesaré". Em segundo lugar, existem dúvidas consideráveis a respeito da própria existência da cidade de Nazaré no tempo de Jesus. Ela não aparece em mapas romanos, documentos ou registros. Não é mencionada no Talmud. Tampouco é mencionada, muito menos associada com Jesus, em nenhum dos textos de São Paulo - que foram, afinal, escritos antes dos Evangelhos. Nem mesmo Flavius Josephus - o mais famoso cronista do período, que comandou tropas na Galiléia e listou as cidades da província - menciona Nazaré.
Em suma, parece que Nazaré não surgiu como cidade até algum tempo depois da revolta de 68-74 d.C., e que o nome de Jesus se tornou associado a ela em virtude de confusão semântica – acidental ou deliberada -, o que caracteriza bem o Novo Testamento.
Sendo de Nazaré ou não, não há tampouco alguma indicação de que Jesus tenha sido um "pobre carpinteiro". Nenhum dos Evangelhos o descreve como tal. Na verdade, as evidências neles contidas sugerem o contrário. Ele parece ter sido bem educado, por exemplo. Parece ter recebido treinamento para rabino e ter privado tão frequentemente com pessoas ricas e influentes quanto com os pobres - José de Arimatéia, por exemplo, e Nicodemus. E o casamento de Canaã seria outro testemunho da condição e posição social de Jesus.
Este casamento não parece ter sido um festival modesto, humilde, conduzido por pessoas comuns. Ao contrário, teve todas as marcas de uma extravagante união aristocrática, um assunto de alta sociedade; presenciado por pelo menos várias centenas de convidados. Havia, por exemplo, muitos serventes, que se apressavam em obedecer às ordens de Maria e de Jesus. Havia um "mestre da festa", ou "mestre de cerimônias", que, no contexto, teria sido uma espécie de mordomo-chefe ou talvez até um aristocrata, ele também. Muito claramente, havia enorme quantidade de vinho.
Quando Jesus "transmuta" a água em vinho, ele produz, segundo a Good News BibIe ["Boas novas sobre a Bíblia"], mais de seiscentos litros, o que corresponde a mais de oitocentas garrafas! E isto adicionado ao que já havia sido consumido.
Considerando todas as coisas, o casamento em Canaã teria sido uma cerimônia suntuosa da aristocracia. Mesmo que o casamento não tenha sido o de Jesus, sua presença nele, e a de sua mãe, sugere que eles eram membros da mesma casta. Só isto explicaria a obediência dos serventes a eles.
Se Jesus era um aristocrata, e se ele foi casado com Madalena, é provável que ela fosse de situação social comparável. E, realmente, parecia ser. Como vimos, entre suas amigas estava a esposa de um importante oficial da corte de Herodes. Mas ela pode ter sido ainda mais importante. Como descobrimos ao seguir as referências nos Documentos do Monastério, Jerusalém - a Cidade Santa e capital da
Judéia - tinha sido originariamente propriedade da tribo de Benjamin.
Depois os benjamitas foram dizimados em sua guerra com as outras tribos de Israel, e muitos deles partiram para o exílio - embora, como sustentam os Documentos do Monastério, alguns tenham permanecido. Um descendente desses remanescentes era São Paulo, que afirma explicitamente ser um benjamita (Romanos 11:1).
A despeito de seu conflito com as outras tribos de Israel, a tribo de Benjamin parece ter gozado de uma condição especial. Entre outras coisas, ela deu a Israel seu primeiro rei - Saul, consagrado pelo profeta Samuel - e sua primeira casa real. Mas Saul foi finalmente deposto por Davi, da tribo de Judá. E Davi fez mais do que privar os benjamitas de sua pretensão ao trono. Ao estabelecer sua capital em Jerusalém, ele os privou também de seu direito legal à herança.
De acordo com todas as narrativas do Novo Testamento, Jesus era da linha de Davi, e portanto um membro da tribo de Judá. Aos olhos dos benjamitas isto pode tê-lo tornado, pelo menos em algum sentido, um usurpador. Esta objeção poderia, contudo, ser neutralizada se ele fosse casado com uma mulher benjamita. Tal casamento teria constituído uma importante aliança dinástica, repleta de conseqüências políticas. Ela não só teria fornecido a Israel um poderoso rei-sacerdote, como também teria desempenhado a função simbólica de devolver Jerusalém aos seus donos originais e legítimos.
Assim, ela teria servido também para encorajar a unidade e o apoio popular, consolidando qualquer pretensão ao trono que Jesus pudesse ter.
O Novo Testamento não dá nenhuma indicação da filiação tribal de Madalena. Em lendas posteriores, contudo, ela teria sido de linhagem real. E existem outras tradições que afirmam especificamente que ela era da tribo de Benjamin.
Neste ponto, começaram a ficar discernÍveis as linhas gerais de um cenário coerente. E, até onde podíamos ver, havia nele um sentido político razoável. Jesus teria sido um rei-sacerdote da linhagem de Davi, que possuía uma pretensão legítima ao trono. Teria consolidado sua posição através de um casamento dinástico simbolicamente importante. Teria então ficado em condições de unificar seu país, mobilizar o povo ao seu redor, expulsar os opressores, depor a marionete abjeta e restaurar a glória da monarquia, como na época de Salomão. Tal homem teria sido realmente o "rei dos judeus".

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