Fogo no Céu. O sangue que queimava como óleo. Um clangor de metal. Espadas. Lâminas que se chocavam. Gritos de combate. Calor. Ódio. O coração que clamava por justiça. E o chão desmoronando sob nossos pés, uma força terrível que nos dragava para baixo, nos puxava para fora, ferindo-nos.
Em seguida, as estrelas. O espaço. O frio. Um explosão nebulosa. Caíamos, despencávamos e não conseguíamos mais voar. Abandonados. Expulsos. Renegados.
A matéria sucedeu-se ao abismo. A terra. A areia que grudava na pele. As asas manchadas de sangue. A vergonha que se transformara em vingança.
Era a expulsão dos anjos renegados. Eram as últimas lembranças e mais profundas recordações da insurreição e de nossa posterior chegada ao mundo dos homens, diz Ablon.
Acontecera ali, naquelas mesmas planícies, chamadas outrora de Terra de Nod, havia 2.500 anos (atual ano 1 a.C.). O deserto fora nosso ponto de partida. A Haled, nossa prisão.
Desconsolados e perseguidos, os anjos renegados caminharam juntos para oeste, escapando de seus algozes, até encontrar a cidade devastada de Enoque, submersa nas entranhas do mundo, desde o dilúvio que a liquidara.
Rancorosos e vingativos, os espíritos de seus habitantes, que ainda vagavam pelos escombros da metrópole afundada, aceitaram-nos em seu refúgio. Reconheceram-nos como inimigos dos arcanjos e, com sua energia astral levantaram uma cobertura mística, que ocultou as emanações de nossa aura pulsante. Naquele lugar, naquela cidade perdida, não seríamos descobertos e teríamos o tempo necessário para planejar nossas entrada na sociedade mortal.
Aprendemos a ocultar nossas vibrações e decidimos não desprender mais as asas, a fim de nos confundirmos com os humanos. As inscrições, as obras de arte e os documentos antigos nos ensinaram tudo que precisávamos saber sobre a natureza terrena.
Aprendemos a ler e a falar o idioma de Enoque, que formou as bases para todas as línguas da terra.
Enoque foi nosso santuário, o primeiro e último refúgio da Irmandade dos Renegados, o lugar onde aquele formidável grupo de guerreiros se reuniu pela última vez. Foi no túmulo dos homens que deixamos nossa divindade. Foi ali que abandonamos nossa glória.
Enoque, a Primeira e Última.
Foram tempos difíceis, mas ao menos estávamos juntos, os dezoito anjos renegados, diz Ablon.
Enoque, a Primeira e Última.
Nenhum comentário:
Postar um comentário