quarta-feira, 29 de junho de 2016

Manuscrito Sagrado dos Malakins (parte 01)

Poucos sabem como começou. Ou o que havia antes. Não que isso importe, realmente. Porque não houve um antes. Aconteceu em um tempo em que o próprio tempo não existia, e a matéria não passava de um grão de energia, flutuando na sombra do espaço.
Guerra, Luz e Trevas, Lei e Ordem. Claro e Escuro. Bem e Mal.
Sobreveio a explosão. Indescritível. Inimaginável. Ensurdecedora. O universo se expandiu, lançando fragmentos na negritude, formando ondas de poeira cósmica, dando origens as dimensões paralelas. Mundos inteiros foram criados. Estrelas nasceram e morreram, nebulosas surgiram nos oceanos de plasma. Galáxias se condensaram.
Por bilhões de anos, os alados vagaram sozinhos, intocáveis no santuário infinito. E, quando o sexto dia terminou, Deus estava orgulhoso de seu trabalho. De todas as maravilhas, a espécie humana foi a que ele mais adorou: sua criação podia aprender, evoluir e amar.
Yahweh partiu para o descanso do sétimo dia e deixou aos cinco arcanjos a tarefa de comandar os celestes, reger o paraíso e servir a humanidade, sem interferir em seu curso. Mas, inflados de ciúmes e luxúria, os primogênitos invejaram a raça mortal. Miguel, o Príncipe dos Anjos, decidiu que os homens não eram herdeiros dignos de Deus e resolveu tomar a terra de assalto. Enviou assassinos, fomentou cataclismos, explodiu vulcões, provocou terremotos e congelou o planeta.
O paraíso se dividiu. A primeira revolta foi esmagada, e os conspiradores, expulsos. A tensão entre os gigantes (arcanjos) cresceu, culminando numa batalha devastadora, que secionou para sempre as hostes divinas. Lúcifer, o Arcanjo Sombrio, desafiou a autoridade do onipotente Miguel, atraindo um terço das legiões para sua causa. Mas suas ambições eram igualmente malignas e, vencidos, os anjos caídos foram atirados ao inferno, onde aguardam o momento oportuno para completar sua vingança.
Milênios mais tarde, os focos da rebelião, sufocados no princípio, se reacenderiam numa nova chama. O arcanjo Gabriel, servo mais leal do Príncipe Celeste, recebeu a missão de descer a Haled para planejar uma nova catástrofe. Mas, em seus corpos terrenos, os anjos são vulneráveis aos sentimentos carnais. Pela primeira vez, ele provou o calor da alma humana e entendeu o amor que sentia por Deus. Repudiou as ordens do irmão e assim começou uma nova guerra, a guerra civil, a eterna disputa pelo paraíso, que persiste até hoje.
Reunidos no Primeiro Céu, Gabriel e os exércitos rebeldes iniciaram uma gigantesca campanha contra as forças legalistas, estacionadas na quinta camada. O Quarto Céu, Acheron, transformou-se numa violenta zona de combate, onde os querubins lutam dia e noite há mais de dois mil anos.
Quando os revoltosos avançaram, derrubando fortalezas e ganhando posição, Miguel, temeroso de perder o trono, ordenou o Haniah, o Retorno, determinando que todos os seus aliados que atuavam ou que estavam no plano material regressassem imediatamente. Com o contingente inimigo aumentando, Gabriel fez o mesmo, e a Haled foi abandonada. Os vórtices de acesso as dimensões superiores foram fechados, restando alguns poucos, guardados por poderosos vigias.
A casta dos Elohins, cuja natureza é viver entre os homens, obteve permissão espcial para continuar no mundo físico, assim como outros desgarrados, que se recusaram a voltar. A única condição era que não interviessem no rumo da guerra e estivessem prontos para servir seus arcanjos quando o dever os chamasse.
Enquanto o paraíso queimava num embate de sangue e espadas, os dois lados estabeleceram um armísticio na terra, uma trégua frágil e delicada, que pode desmoronar a qualquer instante.
Isolada no Sexto Céu, a ordem dos Malakins traçou suas previsões. Aquela não seria  mais uma guerra. Havia começado. Era o princípio do fim.

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